Um balanço de trinta anos nos pomares em Palmas Paraná

Pomares de Palmas

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A Agricultura é uma atividade que fascina aos que dela dependem por uma peculiaridade: dê a um Agricultor um pouco de terra, plantas, água e sol, e ele vai gerar um produto que alimentará bocas famintas. Vai gerar renda a partir de energia luminosa e água, sem a necessidade de tirar dinheiro de outras pessoas ou situações. Isto faz com que nós Agrônomos sejamos apaixonados pelo nosso trabalho e trabalhemos sempre no sentido de otimizar a utilização dos recursos de produção.
Iniciamos a nossa trajetória profissional em Vacaria na Cooperval, em produção de sementes de cerais em abril de 1987. Naquela época fomos á Castro realizar um curso de plantio direto. Voltamos de lá entusiasmados com esta técnica e iniciamos o Plantio Direto em Vacaria. Introduzimos novas técnicas: trocamos o espaçamento de milho para 50 cm, iniciamos a adubação de cobertura com potássio em milho e soja, aumentamos o espaçamento de soja para 60 cm, e o nosso sucesso na Cooperativa levou-nos a um convite para trabalhar na Pomigran Engenharia Agronômica. Nesta empresa trabalhamos por 17 anos. Assistimos a produtores de alho, maçãs, peras, tomates, além de projetos de manejo florestal, crédito agrícola e produtores de cerais. Também ajudamos a implantar o seguro agrícola realizando treinamentos para peritos, e programas de nutrifisiologia vegetal em parceria com a empresa espanhola CNV Sudamerica. Nessa passagem por Vacaria chegamos a atender tecnicamente a 18 produtores de maçãs em uma área total de 1100 há. Na Pomigran tínhamos um quadro de 12 profissionais de Agronomia e assessorávamos cerca de 40 produtores de maçãs.Nos foram confiados 18 desses produtores. Entre eles produtores que assistimos por 17 anos: Agroban, Fazenda do Lagoão, Frigorífico Bortolon, André Saadi, Mario Jacques Cesar, Luis Ivan de Boni, Osvino Pommering, Prax Frutas, Bela Ischia,Manuel da Rosa, e outros tantos que assessoramos por vários anos, em vários cultivos.
O nosso primeiro contato com Palmas foi em 1991 quando aqui viemos como consultores da CNV implantar programas de Nutrição em Macieiras. Conhecemos vários pomares e produtores daqui da região. Naquela época, em pomares assistidos pela CNV colhíamos mais de 50 ton/há e viemos colaborar com produtores de Palmas. O programa da CNV trabalhava com análises foliares e de frutos em vários momentos da cultura e mapeávamos áreas mais produtivas à semelhança do que hoje é feito na Agricultura de Precisão. Tabulávamos os dados em uma planilha Quatro Pro e fazíamos recomendações de adubação, poda e gestão do solo. Fomos pioneiros em várias técnicas: no uso de Fosfitos (trazíamos um produto chamado BS14 FA da Argentina em 1990), no uso de aminoácidos (já usávamos em 1989), redutores de” russeting” (promalina em 1990), redutores de crescimento (paclobutrazol, CCC e Alar em 1989), uso de potássio em cobertura e uso de gesso agrícola e cloreto de cálcio no solo, bem como composto orgânico e pincelamentos com ANA. Também fomos pioneiros em assistência técnica contratada com um cronograma regular de visitas. Infelizmente em 1999 perdemos o Dr Pijuan, e o programa da CNV terminou. Desenvolvemos novos programas baseados em planilha Excel e desta forma trabalhamos até hoje.
Em agosto de 2004 recebemos um convite para trabalharmos em Palmas. Viemos, conversamos com os produtores e acertamos a nossa vinda para o município. Vendemos a nossa casa em Vacaria, e nos fixamos aqui. Nos chamou a atenção o fato de que vários daqueles produtores que havíamos conhecido não estavam mais na atividade. Começamos o trabalho em agosto de 2004 e encontramos vários problemas: pomares com sérios problemas nutricionais de balanço de cátions, problemas de poda, problemas de “russeting”, baixa produtividade, falhas no manejo de pragas e doenças, equipamentos de pulverização inadequados, com fluxo assimétrico de coluna de vento, problema que já havíamos identificado nessas máquinas quando estávamos em Vacaria. Naquele ano fizemos o que foi possível com a estrutura que tínhamos, mas tentamos adaptar os pulverizadores a uma melhor cobertura e, na maioria dos casos, trocar o equipamento de pulverização. Cerca de 5 anos depois, a EPAGRI divulgou um trabalho mostrando os problemas do equipamento que tinha fluxo assimétrico de ar.
O nosso trabalho começou a frutificar e já em 2005 e 2006 colhemos produtividades próximas a 45 ton/há em vários pomares que colhiam 17-20 ton /há antes da nossa chegada. Resolvemos os problemas de sarna e russeting e, já em 2007 iniciamos a reconversão dos ´pomares. Foram plantados vários pomares novos em alta densidade e infelizmente as mudas implantadas trouxeram o cancro europeu. Isto prejudicou a evolução desses pomares, mas, mesmo assim temos ótimos pomares que convivem com este problema. Podemos citar um pomar no Núcleo Jesuíno Mendes (Horizonte) que tem o cancro em seus pomares desde 2007, tendo sido um dos primeiros a apresentar plantas com o cancro. Este pomar vem produzindo perto de 40 ton/há com maçã de ótima qualidade por vários anos. Este pomar é modelo no controle de cancro europeu, e outros pomares plantados na mesma época, com o mesmo problema, já foram erradicados.
Sabíamos da importância de renovar os pomares e o fizemos mesmo que o cancro fosse um problema. Muitos daqueles produtores não estariam mais na atividade se não tivessem renovado os pomares. Seguimos inovando e desenvolvemos novas técnicas: uso de caldas agroecológicas, fertirrigação, uso de redutores de crescimento (realizamos um experimento não divulgado com Prohexadione cálcio em 2011). Entre 2009 e 2011 a maçã passou por uma grave crise com baixos preços e focamos o nosso trabalho na redução de custos. Houve uma nova “ peneiragem” dos produtores e só sobreviveram os que tinham um bom controle de custos. Boa parte dos pomares que hoje sustentam a produção de Palmas, estavam sob nossa orientação naquele período difícil. O controle de custos passa por vários fatores. A mão de obra representa 55 a 60% do custo e, desta forma desenvolvemos o uso de moto poda, fertirrigação, supressão do uso de herbicidas como formas de reduzir custos.
Hoje, mais do que nunca, o controle de custos é fundamental. Houve uma drástica elevação de custos da porteira para fora (fretes, estocagem, classificação, caixas, bandejas, pallets, comercialização etc. que subiram mais de 100%). Também, dentro do pomar houve um aumento dos custos de mão de obra, óleo e lubrificantes, agroquímicos etc. Todos esses segmentos (embalador, caixas, estocadores) tem sua margem embutida no preço de venda e não têm como perder dinheiro. Mas os produtores não têm a margem garantida e, em algumas categorias de frutos se vende abaixo do custo de produção, ou seja, o preço de venda não remunera sequer a caixa e bandejas. Por isso, lá dentro do pomar não se pode fazer gastos desnecessários nem comprar mal. Nesse particular nos orgulhamos de, nesses quase trinta anos de carreira jamais recebemos comissão em venda de insumos por nós recomendados. Isto viola frontalmente o código de ética de nossa profissão e abominamos essa prática. Quem recomenda agroquímicos não pode ser comissionado pela revenda senão vai utilizar mais que o necessário, e vai cobrar em dobro do seu cliente (ganha mensalmente + a comissão) onerando o custo de produção e praticando uma concorrência desleal com os demais colegas.
Na nossa busca por tecnologia e inovação, estamos realizando pesquisa com vários produtos. Nos últimos anos realizamos as seguintes pesquisas:
– Uso de fontes alternativas de cálcio em nutrição de macieiras (Monografia de Especialização 2009);
– Aplicação de Nitrato de cálcio em pós colheita e de fosfato monopotássico em macieiras (2011);
-Uso de Bordasul® e Sulfocal® no controle de doenças de macieiras (2012);
–uso de derivados de peixe no melhoramento de características dos frutos (2013);

Na presente safra estamos realizando os seguintes teste:
-Alternativas ao uso de Cianamida Hiderogenada na quebra de dormência de macieiras, com o produto Bluprins®;
-Indutores de frutificação (produtos Origem ® e Bioflor® em comparação á testemunha e TDZ);
-Uso de derivados da casca de laranja no controle de ácaros e tripés da macieira;
– Uso de micronutrientes na florada de peras asiáticas;
-Uso de produtos biológicos no controle de sarna, mancha foliar, Podridão de olho de boi e cancro europeu;
-Uso de inseticidas biológicos no controle de lagartas, grafolitas e moscas;
– Adaptação de roçadeiras para roçada na projeção da copa e supressão do uso de glifosato;
-Uso de sílica no controle de mancha foliar e na coloração dos frutos;
-Uso de LOC no controle de mancha foliar e na eficiência dos tratamentos foliares;
Em virtude desse nossos trabalhos de pesquisa, fomos convidados a realizar palestras em vários locais , e somos consultores de empresas como Lallemand e Phelps.
Estamos inovando no sentido de usar produtos menos agressivos aos seres humanos e meio ambiente e, também no sentido de baixar o custo de produção; estamos bastante próximos de controlar doenças importantes (olho de boi, sarna e Cancro europeu) com esses produtos inovadores, e buscamos sempre o conhecimento gerado aqui, através de estudo e experimentação.
Todo o profissional de agronomia traz na sua bagagem conhecimentos de bioquímica, química do solo, fisiologia vegetal, toxicologia, herbicidologia, cálculo , hidráulica e várias disciplinas que são exclusivas desta profissão. Isto habilita esses profissionais a realizar trabalhos mais qualificados dentro do pomar. Os profissionais que tenham sempre em mente o código de ética da profissão, e façam do estudo uma ferramenta importante, terão sempre espaço no mercado.
A maçã encontra em Palmas ótimas condições de solo e clima, temos bons “packings houses”, os frutos aqui produzidos são de qualidade superior, e temos fartura de mão de obra para trabalhar. Temos algumas limitações que são excesso de chuvas na florada e na colheita, mas, com um bom acompanhamento técnico é possível superar esse obstáculo. Em um pomar de 20 há se gera a mesma quantidade de emprego e renda que uma pequena fábrica. Sob esta ótica, é imprescindível que a sociedade palmense se mobilize no sentido de manter os pomares em produção.
Nos orgulhamos de, nesses trinta anos de profissão termos semeado ideias, e, mesmo em pomares que não atuamos mais, de alguma forma estamos presentes com as ideias que deixamos( ou que nos são copiadas). Esperamos que, nos próximos anos possamos seguir trabalhando no desenvolvimento desta cultura desafiadora que é a macieira e sobretudo, o façamos com respeito à ética e aos colegas de profissão, da mesma forma que fizemos de maneira ininterrupta nos últimos 30 anos.

Palmas, 19 de fevereiro de 2017
Engº Agrônomo João Henrique de Souza Duarte
SUPPORT AGRONOMIA LTDA.