Necropolítica

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Caminha-se para 400 mil mortos e percebe-se que os brasileiros se acostumaram com a rotina de contagem macabra de corpos, pessoas asfixiadas, sem oxigênio, amarradas a macas por falta de medicamentos para intubação e, muitas centenas, sem leitos. Vem a CPI da Saúde: Pazuello terá a oportunidade de explicar por que doentes de covid-19 morreram asfixiados em Manaus por falta de cilindros de oxigênio, investir em cloroquina enquanto se atrasou a compra de vacinas e de insumos hospitalares, deixar de financiar leitos de UTI em meio à emergência sanitária e não fazer campanha por isolamento social.
O primeiro-ministro da França, Jean Castex, ironiza o Brasil pela prescrição de hidroxicloroquina na pandemia e provoca risos na Assembleia Nacional. Assustaram-se ao saber que Bolsonaro estimula aglomerações; usa termos como gripezinha, frescura, maricas, mimimi; implica com a China; e não toma nenhuma providência por isolamento, uso de máscaras e vacinas. Parece que a estratégia é tumultuar e intimidar. Houve sabotagem nos esforços de combate à pandemia, desorganização sanitária, erros, omissões e negligência.
O país foi afetado pela combinação de vulnerabilidades socioeconômicas e de resposta errática do governo Bolsonaro, com perigo de inação e irregularidades, incluindo promoção da cloroquina como tratamento, mitigando efeitos do seu negacionismo. As mudanças no ministério da Saúde geraram instabilidade administrativa e técnica. O desastre criado é tema de artigos nas duas principais revistas científicas mundiais, The Lancet e Science, explicitando ao planeta a má gestão do governo brasileiro. No Parlamento Europeu, deputados estão escandalizados e pedem punições ao governo brasileiro. Deputados norte-americanos pedem ao seu presidente que não se destine verbas ao Brasil.
Diante disso tudo, o que mais espanta é o apoio de milhões de brasileiros contra a saúde do Brasil e a vida dos seus irmãos. Entende-se esse movimento de massa de manobra quando elementos se juntam em torno de um objetivo comum: apoiar cegamente Bolsonaro, depositando nele desejos e idealizações, e tornando a si mesmo sujeitos submissos e dedicados. Bolsonaro é modelo que gostariam de ser; é objeto de desejo de seus seguidores que jamais desaprovarão seu ídolo. O interessante é que não se espera que seguidores tenham consciência plena enquanto membro da massa.
Uma pessoa apaixonada no grupo rebaixa sua consciência e reduz sua capacidade de julgamento racional acerca do líder e nele investe afetivamente. Tais seguidores idealizam Bolsonaro como quem gostariam de ser ou são. Os bolsonaristas sentem-se protegidos pelo seu líder, ilusão comum às fantasias afetivas. Acham que há relação entre líder e seguidores, pois sugerem proximidade e pertencimento. Identificam-se entre si e funcionam como apoio alheio; sentem-se onipotentes, crentes na autoridade, intolerantes, sugestionáveis e autômatos. Quem não é bolsonarista é inimigo!
É importante ressaltar a história dos madeireiros: quilômetros de floresta caem seguidamente e seus troncos saem em frotas de caminhões com documentação falsa. Se alguém tentar investigar, é demitido. O superintendente da Polícia Federal no Amazonas, Alexandre Saraiva, atribui ao ministro do Meio-Ambiente, Ricardo Salles, conivência e, enviou ao STF notícia-crime contra Salles por obstrução de investigação ambiental, advocacia administrativa e organização criminosa. De onde Bolsonaro consegue tantos ministros de baixa envergadura como Salles, Weintraub, Araújo e Pazuello?
As projeções de crescimento para 2022 são de 1%: serão nove anos de pobreza piorada e parece que o povo se acostumou às catástrofes econômicas, sociais, educacionais e de saúde. Não dá para aguentar mais, todos os dias, mortes em torno entre 3 e 4 mil pessoas, nem gritos fortes de autoridades para se convencerem, enquanto iludem eleitores que veem nele a chance de ressignificar a própria fraqueza. O Brasil está destroçado e todos sabem que já passou a hora da CPI e sim, que é hora de atitude, como o impeachment.