A miséria na América Latina vem aumentando desde 2016: a pobreza total está em 30,8%; e a extrema, em 11,5%, segundo o recente relatório da CEPAL. O número de pobres é de 191 milhões; e na extrema pobreza, 72 milhões. Conforme o relatório, entre 2014 e 2018, 21 milhões de pessoas tornaram-se pobres; e 20 milhões, passaram à extrema pobreza: têm profundos déficits de acesso a direitos básicos como educação, trabalho e previdência. A desigualdade voltou com força ao debate na região, na esteira dos protestos no Chile e na Colômbia.
Violência e desigualdade vêm alimentando há 15 anos o cotidiano urbano. Os modelos neoliberais aplicados na América Latina mostraram-se impróprios, com crise econômica, política, cultural e ecológica. A população exige respeito aos direitos humanos e que a dignidade de todos seja preservada. É frustrante a crescente alta de desemprego e a perda de renda em meio a uma das crises mais profundas da história em relação à insegurança econômica medida por indicadores de desigualdade social, renda e emprego.
Tal pobreza tem muitas causas, mas a principal é a falta de acesso dos jovens ao cuidado na primeira infância e à educação fundamental de qualidade, que garanta o aprendizado em matemática e português que, sem isso, os resultados são baixa produtividade e pouca mobilidade social. Não se pode ignorar o desastre de um país que descuida das novas gerações. É importante que se permita a retomada do crescimento sustentado à solidariedade social.
É errado estimular violência e ódio às polícias, perseguir artistas e jornais como a centenária Folha de São Paulo e estimular a indústrias de armas e de equipamentos de vigilância. O atual governo acredita que a fórmula mágica da erosão de direitos é essencial à salvação do Brasil: querem governar sem freios e limites, com extraordinários poderes que permitam remover obstáculos, dissolver Câmara e Senado, cassar mandatos, censurar manifestações públicas, e cogitar um novo AI-5 como resposta a eventuais protestos contra o pacote de reformas de Guedes que objetivam Estado mínimo na proteção social e Estado máximo na repressão e encarceramento.
A insegurança econômica da população, quando combinada ao fundamentalismo de mercado, pode tornar-se o calcanhar de Aquiles do Bolsonaro: um Brasil de ameaças, ódio, polarização política, neofascismo, aliança com milícias, desrespeito aos direitos sociais e civis, desprezo aos direitos de mulheres, negros, indígenas e homossexuais, à defesa da tortura e à pregação da violência. Não se pode festejar o golpe de 1964, homenagear torturadores e religiosos, perseguir jornalistas, defender imunidade para policiais que reprimem protestos e que atiram a esmo.
Vive-se em estado de anomia, condição em que a autoridade não é mais reconhecida por cidadãos porque se convenceram de que a lei não é para todos e confundem-se em o que vale e o que não vale. É preciso pensar na provisão de serviços de saúde, educação e segurança, além do cuidado com a imensa população de periferias urbanas pois, com desleixo, não se avançará à maior igualdade de oportunidades. O desenvolvimento do país não pode ser desumano. Combater a desigualdade tornou-se não só imperativo moral, mas necessidade econômica.
Edmundo Pozes da Silva Pós-Doutor em Administração-Professor Associado- Presidente do Núcleo Docente Estruturante- Coordenador de Curso Pós-Graduação-Eixo de Gestão e Negócios
Instituto Federal de Santa Catarina – IFSC